(Ciclo C – Domingo 2 da Quaresma)
NÃO HÁ «TRANSFIGURAÇÃO» SEM LUTA!
A Natureza – desde os seres vivos mais variados – é abundante em exemplos, “de esforço, trabalho, sacrifícios”(?)… para atingir uma meta ou objetivo futuro, que sempre se afigura de prazer e conforto ou de satisfação “instintiva”… Quem é que não observou, por exemplo, um animal selvagem, dos chamados “predadores”, a perseguir uma “presa” que constitui o alimento próprio e o da sua prole? Como é capaz de chegar a perder o fôlego e as forças até ficar esfalfado e quase exausto, só por atingir o objetivo que sacie a sua fome! E a simples proximidade de alcançar a sua “meta” parece como que lhe dá um suplemento de energia e lhe aumenta a resistência quando parece esgotar-se!… Ou, aqueles outros bichos que se alimentam de frutos, raízes ou bolbos, enterrados por vezes a certa profundidade: eles são capazes de escarvar e arranhar no terreno duro – até perder as unhas ou garras! – para atingir o cobiçado alimento!… E, claro, a espécie humana não havia de ser uma exceção, como verificamos continuamente pela nossa experiência, quer ao simples nível biológico – tal como esses nossos irmãos bichinhos – quer ao nível do espírito, onde agora nos movemos.
Mas atenção. Em todos os casos, como apontam os filósofos, «o último na realização é o primeiro na intenção». Ou, por outras palavras, se não estiver presente, desde o início, o objetivo final prazeroso, não se poria em ação o exercício trabalhoso e difícil para o conseguir.
A pedagogia de Deus foi e será sempre essa, com relação aos humanos, seus filhos: para que não desanimem ou desistam, “apresenta-lhes”, primeiro, a recompensa ou prémio que desejam e apetecem, e só depois traça-lhes o caminho e as exigências para o atingir…
Relativamente a Abrão – quando ainda não era “Abr(a)ão” («abr-ham»=«pai das gentes») mas apenas um homem à procura do seu caminho – é-lhe feita a promessa de um futuro feliz: “Disse Deus a Abrão: «Olha para o céu e conta as estrelas se fores capaz… Pois assim será a tua descendência»… E nesse dia, o Senhor estabeleceu com Abrão uma aliança, dizendo: «Aos teus descendentes darei esta terra, desde o rio do Egipto até ao grande rio Eufrates»”. Estas promessas favoráveis e venturosas aumentam a força e a coragem, essa fé firme daquele «primeiro crente», para que não desanime nas dificuldades que lhe esperam, e que são logo descritas: “…Então, apoderou-se de Abrão um sono profundo, enquanto o assaltava um grande e escuro terror; quando o sol desapareceu e caíram as trevas, um brasido fumegante e um archote de fogo passaram entre os animais cortados…”. (Gn 15 / 1ª L.).
E para o Seu Filho Primogénito, o Pai utilizou esse mesmo estilo pedagógico. “Subiu (Jesus) ao monte, para orar. Enquanto orava, alterou-se o aspeto do seu rosto, e as suas vestes ficaram de uma brancura refulgente… Viram a glória de Jesus… e ouviram uma Voz, que dizia: «Este é o meu Filho, o meu Eleito: escutai-O». A verdade é que, por aqueles dias, a perspetiva obscura “da Sua paixão e morte na cruz”, cada vez mais iminente, estava a significar, para Jesus, preocupação e sofrimento, aliás, como para qualquer ser humano. Tanto que, no mesmo palco da Transfiguração, “aparecem aqueles dois personagens, Moisés e Elias, a conversar com Ele, acerca da Sua morte, que ia consumar-se em Jerusalém”. (Lc 9 / 3ª L.). Realmente, agora era preciso descer do «monte da Transfiguração» e retomar a vida… porque, a vida continua!
Para todos, em geral – principalmente para os que, no meio dos “combate da fé”, optam por uma vida sincera e fiel, seguindo a senda da Verdade – o apóstolo Paulo lembra o “estado futuro” de Glória que nos espera: “…Mas a nossa pátria está nos Céus, donde esperamos, como Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo miserável, para o tornar semelhante ao Seu corpo glorioso”. Assim, com esta perspetiva venturosa, já estaremos preparados para “enfrentarmos” as maiores dificuldades nas lutas que teremos de suportar pela vida fora… Fiquemos, então, com a exortação enérgica e veemente de Paulo, aos cristãos das Comunidades de Filipos: “Irmãos: Sede meus imitadores e ponde os olhos naqueles que procedem segundo o modelo que tendes em nós. Porque há muitos… e agora digo-o a chorar, que procedem como inimigos da cruz de Cristo… e o fim deles é a perdição… Portanto, meus amados e queridos irmãos, minha alegria e minha coroa, permanecei firmes no Senhor!”. (Fl 3 / 2ª L.).
É verdade. Neste tempo da nossa vida “espácio-temporal”, é preciso percorrermos «caminhos de cruz»! Mas a “pedagogia amorosa” de Deus vai dispondo alguns «esteios» gloriosos de “transfiguração”, no caminho… para nos estimular e animar, seguindo sempre o Modelo do Filho Primogénito (no «monte da Transfiguração»).
Cada um de nós pode proclamar:
Tu, Senhor, és a minha luz e salvação,
– que orienta os meus passos no caminho –
a quem hei de temer?
Tu, Senhor, és o protetor da minha vida
– nos perigos, nas cruzes e nas lutas –
de quem hei de ter medo?…
E todos sentimos a Tua voz no coração:
«Procurai a minha face».
– A Tua face buscamos sempre, Senhor,
mormente nos momentos de angústia,
pois sabemos que nunca nos escondes
o Teu rosto luminoso que nos “transfigura”…
Esperamos, ó Pai, vir contemplar
a Tua Glória e Bondade na terra dos vivos,
onde seremos Transfigurados, Glorificados…
Por isso, eu direi sempre ao meu irmão,
quando ele se sentir desanimado:
Confia no Senhor, sê forte!
Tem coragem e confia no Senhor!
[ do Salmo Responsorial / 26 (27) ]
26 Fevereiro, 2016
O «NOME» E OS NOMES DE DEUS.
Luis López A Palavra REFLETIDA 0 Comments
(Ciclo C – Domingo 3 da Quaresma)
O «NOME» E OS NOMES DE DEUS.
Não foi o que parecia!
Afinal, o verdadeiro Nome de Deus não era o que Moisés escutou diante da “sarça ardente”… Mas isto só se soube muito tempo depois!
Naquela altura, “Moisés disse a Deus: «…Mas se eles me perguntarem qual é o nome desse Deus, que hei de responder-lhes?». Disse Deus a Moisés: «Eu sou ‘Aquele que sou’». E prosseguiu: «Assim falarás aos filhos de Israel: O que Se chama ‘Eu sou’ [‘יהוה’] enviou-me a vós». Deus disse ainda a Moisés: «Assim falarás aos filhos de Israel: ‘O Senhor, Deus de vossos pais, Deus de Abraão, Deus de Isaac e Deus de Jacob, enviou-me a vós. Este será o meu nome para sempre…” (Ex 3 / 1ª L.).
Não deixa de ser complicado, e, desde logo “enigmático”, este nome…
Terão de passar séculos, até aparecer, na chamada «plenitude dos tempos», o próprio Filho de Deus – incarnado como o «rosto da misericórdia de Deus» (“misericordiae vultus”) – para desvelar o mistério, e revelar o Verdadeiro Nome de Deus…
O Evangelho de hoje, parece apenas retirar o primeiro desses véus que ocultaram durante séculos o nome genuíno, autêntico, do Deus dos nossos pais, o Deus de sempre… Efetivamente, a atitude de Deus – de uma Paciência infinita – não se deixa influenciar por “outros eventos” (“o sangue de certos galileus, que Pilatos mandou misturar com a dos sacrifícios que eles imolavam”); como também, o proceder de Deus nunca pode depender de “acontecimentos acidentais” (“a queda da torre de Siloé que atingiu e matou dezoito homens”)… (Lc 13 / 3ª L.). Não. O nosso Deus não pode ser assim!
É que o verdadeiro “nome de Deus” não era só “«Eu Sou»”[=“Javé”/‘יהוה’] (Ex 3) tal como lhes pareceu “entender” àqueles nossos «primeiros pais na fé»… Isto é, aquele «Deus Terrível» («Sabaot = Deus dos Exércitos»; «Adonai = Senhor»;…) a quem, portanto, havia que “temer”, e em cuja presença era necessário “cobrir o rosto para não ficar ofuscados” (Ex 3). Pois, na realidade, os “Verdadeiros Nomes” de Deus são outros. São aqueles Nomes que – muito tempo depois – foram revelados precisamente pelo Filho Primogénito de Deus (e que outras culturas e religiões também chegaram a “intuir”). Todos os cristãos, e muitos outros homens de boa vontade, conhecemos este «Nome de Deus», “revelado” por Jesus de Nazaré: “Rezai assim: Pai-nosso (“Abbá”) que estás no Céu…” (Mt 6, 9; Lc 11, 2).
E esta grande novidade – a palavra “Pai” como nome atribuído a Deus pelo próprio Jesus – aparece, só nos Evangelhos, mais de duas centenas de vezes. A Grande Revelação que o Filho, Jesus, trouxe para todos os homens, é esta: Que Deus é, sobretudo e entes que nada, PAI. Realmente, os Textos sagrados do Novo Testamento, a começar pelos Evangelhos, estão inundados, perpassados, por este «divino nome de Pai». (Nos restantes Livros do Novo Testamento, aparece outra centena de vezes). É preciso afirmarmos – com toda a verdade! – que este Nome é o primeiro e principal, a “raiz e origem” de todos aqueles outros nomes que também atribuímos a Deus: o Deus-Amor, o Misericordioso, o Clemente, o Compassivo, o Omnipotente, o Omnisciente, o Omnipresente, o Transcendente, etc. etc. Pois todos eles derivam deste nome essencial, fundamental, que é “Pai”!
E é sabido que, na Bíblia, o sentido do «nome das pessoas» diz respeito a «algo de profundo e essencial da pessoa»; e era isso que se tinha em conta ao pôr o nome a cada novo ser humano que vinha a este mundo…
Por seu lado, o apóstolo Paulo tem toda a razão quando compara a nossa conduta com a daqueles nossos antepassados (1 Cor 10). E é aí que tem bem clara uma coisa: a “fidelidade”… ou a “infidelidade”… dos “nossos avôs” (dos nossos “antepassados”) não nos “justifica”… Poderíamos dizer que os «nomes» deles não “determinam”, nem afetam, o «nome» de cada um de nós, este nome que é o nosso “nome essencial”. O nome que, ao longo da vida, fomos adquirindo; o nome que vamos “demonstrando” com a nossa conduta e atitude na vida; mas um nome que – geralmente – nada tem a ver com o significado do outro nome que nos puseram à nascença…
Quer dizer, nisto como em tudo, cada um responde, por si mesmo, dos próprios atos, palavras e intenções, na sua vida. Por isso, Paulo conclui com esta exortação: “Quem julga estar de pé tome cuidado para não cair”. (1 Cor 10 / 2ª L.).
Em cada circunstância, cada qual deve responder pelo seu “Nome essencial”!
Em Ti, ó Deus, em Teu «nome de PAI»,
têm sentido, valor e significado,
todos os nossos «nomes» de filhos.
Que a nossa alma Te bendiga,
que todo o nosso ser – em cada respiração –
bendiga sempre o Teu santo nome de PAI…
porque Tu és Clemente e cheio de Compaixão.
Nunca esqueceremos os Teus dons e graças:
perdoas sempre os nossos pecados;
curas com ternura as nossas doenças;
salvas da morte a nossa vida;
e nos inundas da Tua Graça e Misericórdia
– grande como a distância da terra aos céus – …
Ao revelares a Moisés, naquela sarça-ardente,
o Teu primeiro nome de «Javé»,
revelaste-lhe, também, os Teus caminhos,
deste-lhe a conhecer os Teus benefícios…
E nós proclamamos aos quatro ventos:
O nosso PAI Deus é sempre Clemente e Compassivo!
[ do Salmo Responsorial / 102 (103) ]