(Ciclo C – Domingo 21 do Tempo Comum)
«“PROSELITISMO”, SIM, NÃO»
Um dos livros Sapienciais do AT, onde aparece recolhida a “sapiência” ou «sabedoria popular» através de muitas gerações, é citado na Palavra deste domingo (na Carta aos Hebreus): trata-se do Livro dos Provérbios, e o texto transcrito é este: “Meu filho, não rejeites a correção do Senhor, nem te irrites quando Ele te repreender, pois o Senhor castiga aquele a quem ama, como um pai a um filho querido” (Pr 3). Mas o autor da Carta continua, esclarecendo aos cristãos do seu tempo: “É para vossa correção que sofreis. Deus trata-vos como filhos. Qual é o filho a quem o pai não corrige? Nenhuma correção, quando se recebe, é considerada como motivo de alegria… Mais tarde, porém, dá àqueles que assim foram exercitados um fruto de paz e de justiça”… (Hb 12 / 2ª L.). Pois este “conselho”, recolhido do livro dos Provérbios, vai dedicado, antes de mais, a todos aqueles “pais/mães” do nosso tempo que se esforçam – geralmente «contra vento e maré» do ambiente – por “corrigir” os seus filhos, da melhor maneira que sabem e podem. É verdade, os frutos desta correção, embora difícil, tanto para quem a dá quanto para quem a recebe, serão sempre bons (“de paz, de justiça”) tal como o futuro da “não correção” – de “tolerância máxima” ou “exigência zero” como se costuma dizer – são os “frutos amargos”… que se verificam. Aí está a história (de umas sociedades mais, de outras menos) nestes tempos que nos foi dado viver!
Acontece, por outro lado, que é hábito chamar “castigos de Deus” às correções ou censuras divinas, e esquecemos – lembram-se? – que Deus nem quer nem precisa de “castigar” a ninguém… até porque já existem, provenientes das forças do mal e de nós próprios, causas, motivos e meios bastantes para as “autopunições nossas de cada dia”. (Pena que continuemos a arrastar uma linguagem “deturpada”, que herdamos do «Antigo Testamento»). Digamos, então, que a única ocupação e preocupação de Deus é que o Seu Amor-Verdade chegue a todos, até aos confins da terra… (“para que todos se salvem”!). Vejamos:
“Eis o que diz o Senhor: «Eu virei reunir todas as nações e todas as línguas, para que venham contemplar a minha glória. Eu lhes darei um sinal e de entre eles enviarei sobreviventes às nações: a Társis… a Túbal… às ilhas remotas… para que anunciem a minha glória entre as nações”. (Is 66 / 1ª L.). E o primeiro Enviado de Deus, para esta Missão, foi o Seu Filho Jesus Cristo, quem, por sua vez, continua sempre a “enviar” apóstolos e missionários, para que essa Salvação chegue a todos.
E, uma vez que esta missão apresenta-se difícil e árdua, é o próprio Jesus que vai alertar a todos, no Evangelho de hoje. Perante a pergunta que alguém Lhe lançou, “«Senhor, são poucos os que se salvam?», Ele respondeu: «Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, porque Eu vos digo que muitos tentarão entrar sem o conseguir»”… E, finalmente, acrescenta (em perfeita concordância com a 1ª leitura de Isaías 66): “Hão de vir do Oriente e do Ocidente, do Norte e do Sul, e sentar-se-ão à mesa no reino de Deus. E há últimos que serão dos primeiros e primeiros que serão dos últimos»”. (Lc 13 / 3ª L.). Portanto, essa é a ocupação constante de Deus, junto com o Perdão e a Misericórdia para todos… E Ele deixa todo o resto para os outros (incluindo os tais “castigos”).
Mas… isso sim, o Senhor quer que todos nós – como Ele e com Ele – sejamos igualmente constantes, perseverantes, para não abandonar a verdadeira “correção” (a nós próprios e aos outros) aquela de que falámos no início da nossa Reflexão. De outro modo, deita-se a perder a obra iniciada ou realizada, em cujo caso seríamos culpados e vítimas, conforme aquela “terrível invetiva” de Jesus: “Ai de vós, doutores da Lei e fariseus hipócritas, que percorreis o mar e a terra para fazer um prosélito e, depois de o terdes seguro, fazeis dele um filho do inferno, duas vezes pior do que vós!” (Mt 23,15). Quer dizer, será preciso cultivar e animar – “corrigir” – para não perdermos o que fomos “construindo”.
Então, com o autor da carta aos Hebreus, concluamos, animando a todos e dizendo-nos a nós próprios: “Por isso, levantai as vossas mãos fatigadas e os vossos joelhos vacilantes e dirigi os vossos passos por caminhos direitos” (Hb 12 / 2ª L.).
Bem sabemos, Senhor, que o Teu Amor é eterno;
que passas por cima de tudo e ficas com o essencial;
que queres que todos os homens se salvem
e cheguem ao conhecimento da Verdade…
É verdade, Senhor e Pai nosso:
“É firme a Tua Misericórdia para connosco
e a Tua Fidelidade permanece para sempre”.
É o que queremos transmitir a todos,
ao escutarmos a Palavra do Teu Filho Jesus:
“Ide por todo o mundo, anunciai a Boa Nova!”.
Temos aprendido com Jesus, ó Pai,
que “o caminho da salvação não é fácil”,
e que “há últimos que serão dos primeiros
e primeiros que serão dos últimos”…
Mas nós prometemos colaborar com Jesus
e com todos os irmãos de boa vontade,
para levar a Boa Nova da Salvação a todos,
e saber “acompanhá-los” no Caminho da Vida…
Assim poderemos entoar, com verdade, este hino:
“Louvamos-Te, Senhor, com todas as nações,
e aclamamos-Te com todos os povos da terra!”.
[ do Salmo Responsorial / 116 (117) ]
26 Agosto, 2016
O «ESPETACULAR» EFÉMERO ou O «SIMPLES» DEFINITIVO!?
Luis López A Palavra REFLETIDA 0 Comments
(Ciclo C – Domingo 22 do Tempo Comum)
O «ESPETACULAR» EFÉMERO ou O «SIMPLES» DEFINITIVO!?
Quem é que não fica espantado, deslumbrado, maravilhado, perante esses espetaculares “efeitos especiais”, criados nestes últimos tempos pelas indústrias audiovisuais, cinematográficas, musicais… e que nos transportam a estados e cenários de outras Galáxias, de uma “outra dimensão”!? Como é que a imaginação-criatividade humana é capaz de “reproduzir situações”, mais ou menos “virtuais”, acerca de coisas que «não são» (ou «são»?) porque só podem existir para além das nossas “coordenadas espácio-temporais”?… Porém, era bom pensarmos, que estas cenas espantosas e alucinantes não são novas; já foram criadas “pela imaginação” humana – se bem que inspiradas por uma ação sobrenatural – há mais de vinte séculos!… Basta pensarmos, nomeadamente nos livros dos profetas Ezequiel e Daniel, e sobretudo no Apocalipse (ou Revelação) … para verificarmos como é que esses “videntes ou visionários” foram capazes de descreverem aquelas cenas e realidades “imaginárias ou fantásticas”, cheias de colorido e expressividade… que, afinal, foram as “antecessoras” destes atuais “efeitos especiais” ou de “ciência-fição”, produzidos por meios “apenas físico-naturais”.
E é interessante constatar que o texto da Carta aos Hebreus, da Eucaristia de hoje, vai ajudar-nos a descobrir e distinguir – ao compararmos umas e outras “descrições” – quais são realmente as “imagens” que representam uma realidade presente (para os que já a vivem, nessa “outra dimensão”) ou futura (para os que, ainda nesta dimensão espácio-temporal, vivem da fé); e quais as outras “imagens” que, na realidade, são pura fição e fantasia, quando não fruto de estados psicadélicos ou alucinogénios… O autor desta Carta (contemporâneo do Apocalipse) e para que ninguém se iluda, vai apresentar, em primeiro lugar, o que «não é»: “Vós não vos aproximastes de uma realidade sensível… fogo ardente… nuvem escura… trevas densas… tempestade… som da trombeta e voz retumbante…” (Hb 12); descrevendo, logo a seguir, o que «é e será»: “Vós aproximastes-vos do monte Sião, da cidade do Deus vivo, a Jerusalém celeste… de milhares de Anjos em festa… de Deus, juiz do universo… dos espíritos dos justos… e de Jesus, Mediador da Nova Aliança”. (Hb 12 / 2ª L.). Está tudo dito para quem “tiver ouvidos para ouvir” e “sentido para entender”!
Mas, claro, não podia faltar, na Palavra de hoje – para não ficarem as coisas “no ar” – mostrar o que deve ser o Caminho a seguir para conseguirmos esta última “aproximação” e “conquista”, sem nos perdermos naquelas “representações” meramente espetaculares e fantasiosas… E parece que, mais uma vez, como não podia deixar de ser, o tal “caminho” começa desde “baixo”, para ir ascendendo… e nunca desde “cima”, uma vez que – lembram-se? – desde o topo, desde “a cimeira”, já não se pode subir mais (só é possível cair!). Primeiro, a Palavra de Jesus: “«Quando fores convidado para um banquete nupcial, não tomes o primeiro lugar. Pode acontecer que tenha sido convidado alguém mais importante do que tu; então, aquele que vos convidou a ambos, terá que te dizer: ‘Dá o lugar a este’; e ficarás envergonhado, se tiveres de ocupar o último lugar»”. É evidente que a “atitude oposta” produz o efeito contrário, como o próprio Jesus descreve a seguir… E conclui com a esperada «moral da história»: “«Quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado»”.(Lc 14 / 3ª L.). E até podíamos ajuntar outra «moral» (a do domingo passado) para confirmar isto: “Há últimos que serão dos primeiros e primeiros que serão dos últimos”(Lc 13).
Ou seja, como já sabemos bem, deverá ser o caminho da “humildade” e simplicidade que deveremos transitar, para atingirmos o estado de “elevação e felicidade” que todos ansiamos. Os nossos antepassados na fé já estavam convictos disto – vejam bem! – no século terceiro antes de Cristo. Pois, naquela altura, um nosso amigo, Ben Sira (“filho de Sira”), no seu escrito sagrado, o Livro de Ben Sira (ou Sirácide), dirigindo-se a cada um de nós, deixou este conselho: “Filho, em todas as tuas obras procede com humildade e serás mais estimado do que o homem generoso. Quanto mais importante fores, mais deves humilhar-te, e encontrarás graça diante do Senhor. Porque é grande o poder do Senhor, e os humildes cantam a sua glória…”. (Sr 3 / 1ª L.). – Caminhante, se procuras uma glória superior e uma felicidade definitiva, essa é a tua “situação à partida”, este é o teu caminho, “aprendiz de viajante”!
Senhor, não deixa de ser um mistério
– para nós, humanos, difícil de desvendar –
o facto de Tu preferires sempre os mais humildes,
e virares o rosto perante os grandes e famosos:
exatamente o contrário da atitude do mundo…
Sim, Pai, é verdade, como diz o nosso salmo:
“Tu preparas uma casa para o pobre
e outra, para o abandonado e esquecido”,
enquanto os ricos e auto-suficientes deste mundo
hão de ficar à intempérie dos seus bens e farturas…
Tu és “pai para os órfãos e defensor das viúvas,
desde a Tua morada santa”, onde os esperas a todos,
mas onde não cabem “orgulhos nem soberbas”…
E “preparas também, ó Pai, uma terra espaçosa e fértil
para o oprimido e humilhado”, que vive sem viver!
Porque Tu és o Redentor, por Teu Filho Salvador,
que “conduz os cativos à liberdade definitiva”.
Assim, “os justos se alegram na Tua presença,
exultam, Senhor, e transbordam de felicidade”…
[ do Salmo Responsorial / 67 (68) ]