28c- Não eu, mas a graça de Deus em mim

(Ciclo C – Domingo 5 do T. Comum… ) 

«NÃO EU, MAS A GRAÇA DE DEUS COMIGO»

Naquele episódio engraçado, que nos conta a «História Sagrada» do AT, em que mediram as suas forças – tão desiguais! – o pequeno David e o gigante Golias, aparece bem patente, mais uma vez, que as aparências iludem e que não é a “força bruta”, ou espetacular, que vence nas batalhas; claro, naquelas “batalhas” que, de verdade, nos interessa “ganhar”…

Importa, por isso, conseguirmos dominar as forças do mal, que, por pertencer ao nível do espírito e não da matéria, são muito mais potentes e vigorosas que as forças físicas… É evidente que se o jovenzito David tivesse confiado apenas nas suas débeis forças, comparadas com a espetacular e prepotente força brutal de Golias, não teria conseguido a inesperada e total vitória sobre aquele exército inimigo. Mas, como sabemos, o jovem David começa por reconhecer a sua fragilidade e a necessidade de confiar, por cima de tudo, na “Força de Javé”, ao responder àquele gigante filisteu, antes de iniciar o “combate”, com este desafio: “«Tu vens para mim de espada, lança e escudo; eu, porém, vou a ti em nome do Senhor do universo… O Senhor vai entregar-te hoje nas minhas mãos… e toda essa multidão de gente saberá que não é com a espada nem com a lança que o Senhor triunfa…»” (1 Sm 17). [História de David e Golias].

E é a atitude de David que adotam “os protagonistas” das três Leituras da Palavra de hoje. A começar por reconhecer, na verdade, a sua fraqueza ou impureza ou pecado ou, numa palavra, a sua “incompetência” para realizar «a Missão» que lhes é encomendada em cada caso. Para Isaías, será a sua “impureza” de lábios: “«Ai de mim, que estou perdido, porque sou um homem de lábios impuros, moro no meio de um povo de lábios impuros…»” (Is 6 /1ª L.). Para Paulo será a sua “pequenez” e o ter perseguido os cristãos: “Porque eu sou o menor dos Apóstolos e não sou digno de ser chamado Apóstolo, por ter perseguido a Igreja de Deus…” (1 Cor 15 / 2ª L.). E para Pedro e os companheiros, o “sentirem-se pecadores”. É Pedro que fala, interpretando o sentir dos colegas: “«Senhor, afasta-Te de mim, que sou um homem pecador». Na verdade, o temor tinha-se apoderado dele e de todos os seus companheiros…” (Lc 5 / 3ª L.).

Fica bem patente – em cada um dos três casos – que, na sua situação pessoal, e olhando apenas para as suas próprias “virtudes” ou dotes ou forças pessoais… eles nada poderiam fazer quanto à “função que deverão realizar”. E nós poderíamos imaginar que, se a atitude deles tivesse sido a de confiar nas próprias forças, pelo mesmo facto, o poder de Deus não poderia ter atuado e “vencido”, neles e por eles, as difíceis resistências do mal… É que Deus – devíamos sabê-lo já! – respeita e respeitará sempre a liberdade do homem!

E assim, nunca poderá ser outro o comportamento do Senhor. Pois o “poder” e “graça” de Deus são impedidos de agir (ficam bloqueados) se encontrarem outras “forças oponentes” – auto-suficientes? – que ambicionam “fazer tudo”… Quer isto dizer que, se pretendemos que uma qualquer “empresa ou projeto” se realize, devemos deixar “via livre” à atuação do Senhor, que – isso sim! – vai querer contar sempre com a colaboração necessária das “nossas fracas e humildes forças”…

Aliás, foi este o proceder subsequente e a atitude coerente dos nossos protagonistas, da Palavra que estamos a refletir. Depois do anjo ter tocado, com aquele carvão ardente purificador, os lábios de Isaías (“«Isto tocou os teus lábios: desapareceu o teu pecado, foi perdoada a tua culpa»”), ele continua:  “Ouvi então a voz do Senhor, que dizia: «Quem enviarei? Quem irá por nós?». Eu respondi: «Eis-me aqui: podeis enviar-me»”. (Is 6 / 1ª L.).

Quanto à conduta posterior de Paulo e a sua admirável vocação de «apóstolo das gentes» – bem conhecida de todos – tem a sua explicação nestas palavras com que ele conclui o seu “raciocínio”: “Mas pela graça de Deus, eu sou aquilo que sou, e a graça que Ele me deu não foi inútil. Pelo contrário, tenho trabalhado mais que todos eles, não eu, mas a graça de Deus, que está comigo”… (1 Cor 15 / 2ª L.). E o «nosso argumento» fica precisamente resumido nesta última frase: “a graça de Deus que está comigo”. Onde se vê que, em simultâneo, a «iniciativa é de Deus» e a «colaboração é do homem».

Então, já podemos dizer a Pedro e aos seus companheiros de “faina e tarefa”, que não têm nada a temer, que não há problema nenhum, nem com o seu fracasso “na pesca” nem com o sentirem-se “homens pecadores”, porque o que importa é seguirmos Jesus e trabalharmos no Seu Barco, uma vez que “Jesus disse então a Simão: «Não temas. Daqui em diante serás pescador de homens». Tendo conduzido os barcos para terra, eles deixaram tudo e seguiram Jesus”. (Lc 5 / 3ª L.). Claro que, para tal e como vemos, é necessário deixarmos os “nossos pequenos barcos”, as nossas forças “omnipotentes”(?), e até os “nossos pecados”… para podermos reconhecer (com São Paulo): «Não sou eu, mas a graça de Deus em mim!».

 

É justo e necessário, Senhor,

louvar-Te sempre na presença dos Anjos,

e sentirmos um imenso amor por Ti,

porque sabemos que louvar é amar

A nossa “ação de graças” é contínua, desde que

– da nossa vida anterior acidentada –

aceitamos as nossas torpes misérias

e a nossa incapacidade para o bem…

Reconhecemos, ó Pai, que, por nós, nada somos;

e que, por consequência, nada podemos

se não contarmos com a Tua Graça e Amizade…

Mas, quando Te invoco, sempre me respondes

e aumentas a fortaleza na minha alma.

Sei que Tu és meu Deus e Pai,

que olhas com bondade e ternura

para a minha humildade e simplicidade;

e, ao contemplares a minha pequenez,

pressinto que exaltarás em mim a Tua promessa…

Agora sei que a Tua mão direita me salvará,

e completarás o que em mim começaste.

Senhor, a Tua bondade é eterna:

não abandonarás a obra das Tuas mãos!

De todo o coração Te dou graças,

 voltado sempre para o Teu templo santo!

           [ do Salmo Responsorial / 137 (138) ]