Desta vez, vamos refletir – e desculpem a expressão “teológica” – acerca do «Cristo meta-histórico», ou seja, tentaremos entender o facto de que, Cristo Jesus, por ser homem e Deus, transcende o Seu “tempo histórico” (antes/depois da Sua vida mortal) e o seu “marco geográfico” (dentro/fora do espaço em que viveu). Será que nós também participamos dessa Sua “transcendência”? A resposta é sim, e isto resulta evidente a partir do Seu Evangelho. Continuaremos a refletir nisto futuramente…
Comecemos, então, pela Palavra de hoje. E tenhamos em atenção que os “números” (quantidades) que aparecem na Bíblia têm um duplo significado: o da sua figura ou quantia representada e o do significado “simbólico”. Por exemplo, o significado do número 40 é de limitação e caducidade e, portanto, trata-se de um «número de prova ou experimentação», uma vez que a sua “duração” nunca será ilimitada. Na história bíblica, através deste número – em dias, em semanas ou em anos – indivíduos e comunidades foram testados e postos à prova… Lemos hoje no Evangelho: “Jesus esteve no deserto quarenta dias e era tentado por Satanás. Vivia com os animais selvagens”…(Mc 1). Coisa semelhante aconteceu com vários profetas e personagens bíblicos (Moisés, Elias, Ezequiel, Jonas, David, Saúl…). E, sobretudo, a “prova terrível” do Povo de Deus, no seu conjunto, durante os «40 anos no deserto»… Estes são, portanto, os tempos de prova, que sempre serão limitados. O próprio Jesus vai ficar submetido e sujeito a este significado de caducidade e tentação (como “teste”). Mas, logo de ter sido superada a prova, o mesmo texto evangélico deixa bem claro: “Jesus partiu para a Galileia e começou a pregar o Evangelho, dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o Reino de Deus. Arrependei-vos e acreditai no Evangelho»”. (Mc 1/3ª L.). Ao dizer “cumpriu-se o tempo”, quer significar que, uma vez ultrapassado o espaço da prova, ficou para trás o que era tempo limitado, e agora, quer o Reino de Deus, quer o mesmo Jesus como centro e núcleo desse Reino, já são transcendência!
Isto da superação do tempo e do espaço, vemo-lo, igualmente, no relato do livro do Génesis (da 1ª leitura). Passados os “40 dias do dilúvio universal” (tempo limitado de prova e purificação) o “espaço temporal” é ultrapassado, e a “promessa divina” continua, porque é transcendente. Assim, lemos: “Deus disse a Noé e a seus filhos: «Estabelecerei convosco a minha aliança: de hoje em diante nenhuma criatura será exterminada pelas águas do dilúvio, e nunca mais um dilúvio devastará a terra… Este é o sinal da aliança que estabeleço por todas as gerações futuras: farei aparecer o meu arco sobre as nuvens, que será um sinal da aliança entre Mim e a terra… ” (Gn 9 / 1ª L.).
Por sua vez, o autor da 2ª leitura tem igualmente muito claro que a ação Salvadora de Jesus é «meta-histórica», que não fica apenas circunscrita aos seus “com-temporâneos” nem somente a todos os humanos que vierem depois d’Ele até aos fins dos tempos. Senão que – por se tratar de uma Redenção/Salvação transcendente, “meta-histórica” – atinge por igual a todos, isto é, os anteriores, os contemporâneos e os posteriores ao «Jesus histórico». Lemos, assim, neste texto da primeira carta de Pedro: “Cristo morreu uma só vez pelos pecados – o Justo pelos injustos – para vos conduzir a Deus. Foi por este Espírito que Ele foi pregar aos espíritos que estavam na prisão da morte e tinham sido outrora rebeldes, quando, nos dias de Noé…” (1 Pe 3 / 2ª L.). Onde se vê que a Redenção de Cristo (realizada no tempo: “morreu uma só vez pelos pecados”) tem também carácter retroativo (até os que “estavam na prisão… nos dias de Noé…”). A Salvação de Cristo Jesus é Universal, como não podia deixar de o ser!
E agora nós, quê!?… Pois que, ao iniciarmos esta “Quaresma” (40 dias, que reproduzem igualmente aquele significado bíblico), temos à nossa frente um novo período de prova, testagem, tentação… Trata-se, portanto, de um tempo ainda mais propício para – na nossa vida individual e coletiva – testarmos até que ponto somos capazes… E não teremos desculpas se não realizarmos essa autêntica conversão e purificação, uma vez que nós – isso sim! – somos privilegiados a respeito dos nossos irmãos antepassados “do tempo de Noé”, que, desde logo, não tiveram tantas oportunidades como nós, para a penitência… Não esqueçamos aquilo de: “A quem más se deu mais se pedirá”!
Antes de mais, temos bem presente, Senhor,
que as Tuas graças são eternas
e as Tuas misericórdias também;
porque Tu transcendes o tempo e o espaço,
embora, em Jesus e por Jesus,
quiseste entrar neste espaço e tempo,
que é o nosso tempo-espaço humano…
Assim, nós queremos entrar e caminhar
pelos Teus Caminhos, ó Pai nosso…
Por isso, ensina-nos as tuas veredas
e mostra-nos os Teus caminhos,
pois só Tu és o nosso Salvador transcendente…
E no caminho da nossa conversão e penitência,
ajuda-nos e guia-nos na Tua clemência,
por causa da tua bondade, Senhor…
E porque Tu és bom e reto,
e orientas os humildes na justiça,
dá-nos sempre a conhecer a Tua Aliança,
para aceitá-la e assumi-la na nossa vida…
[ do Salmo Responsorial / 24 (25) ]
19 Fevereiro, 2015
ANTES E DEPOIS DO… «TEMPO»
Luis López A Palavra REFLETIDA 0 Comments
Desta vez, vamos refletir – e desculpem a expressão “teológica” – acerca do «Cristo meta-histórico», ou seja, tentaremos entender o facto de que, Cristo Jesus, por ser homem e Deus, transcende o Seu “tempo histórico” (antes/depois da Sua vida mortal) e o seu “marco geográfico” (dentro/fora do espaço em que viveu). Será que nós também participamos dessa Sua “transcendência”? A resposta é sim, e isto resulta evidente a partir do Seu Evangelho. Continuaremos a refletir nisto futuramente…
Comecemos, então, pela Palavra de hoje. E tenhamos em atenção que os “números” (quantidades) que aparecem na Bíblia têm um duplo significado: o da sua figura ou quantia representada e o do significado “simbólico”. Por exemplo, o significado do número 40 é de limitação e caducidade e, portanto, trata-se de um «número de prova ou experimentação», uma vez que a sua “duração” nunca será ilimitada. Na história bíblica, através deste número – em dias, em semanas ou em anos – indivíduos e comunidades foram testados e postos à prova… Lemos hoje no Evangelho: “Jesus esteve no deserto quarenta dias e era tentado por Satanás. Vivia com os animais selvagens”…(Mc 1). Coisa semelhante aconteceu com vários profetas e personagens bíblicos (Moisés, Elias, Ezequiel, Jonas, David, Saúl…). E, sobretudo, a “prova terrível” do Povo de Deus, no seu conjunto, durante os «40 anos no deserto»… Estes são, portanto, os tempos de prova, que sempre serão limitados. O próprio Jesus vai ficar submetido e sujeito a este significado de caducidade e tentação (como “teste”). Mas, logo de ter sido superada a prova, o mesmo texto evangélico deixa bem claro: “Jesus partiu para a Galileia e começou a pregar o Evangelho, dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o Reino de Deus. Arrependei-vos e acreditai no Evangelho»”. (Mc 1/3ª L.). Ao dizer “cumpriu-se o tempo”, quer significar que, uma vez ultrapassado o espaço da prova, ficou para trás o que era tempo limitado, e agora, quer o Reino de Deus, quer o mesmo Jesus como centro e núcleo desse Reino, já são transcendência!
Isto da superação do tempo e do espaço, vemo-lo, igualmente, no relato do livro do Génesis (da 1ª leitura). Passados os “40 dias do dilúvio universal” (tempo limitado de prova e purificação) o “espaço temporal” é ultrapassado, e a “promessa divina” continua, porque é transcendente. Assim, lemos: “Deus disse a Noé e a seus filhos: «Estabelecerei convosco a minha aliança: de hoje em diante nenhuma criatura será exterminada pelas águas do dilúvio, e nunca mais um dilúvio devastará a terra… Este é o sinal da aliança que estabeleço por todas as gerações futuras: farei aparecer o meu arco sobre as nuvens, que será um sinal da aliança entre Mim e a terra… ” (Gn 9 / 1ª L.).
Por sua vez, o autor da 2ª leitura tem igualmente muito claro que a ação Salvadora de Jesus é «meta-histórica», que não fica apenas circunscrita aos seus “com-temporâneos” nem somente a todos os humanos que vierem depois d’Ele até aos fins dos tempos. Senão que – por se tratar de uma Redenção/Salvação transcendente, “meta-histórica” – atinge por igual a todos, isto é, os anteriores, os contemporâneos e os posteriores ao «Jesus histórico». Lemos, assim, neste texto da primeira carta de Pedro: “Cristo morreu uma só vez pelos pecados – o Justo pelos injustos – para vos conduzir a Deus. Foi por este Espírito que Ele foi pregar aos espíritos que estavam na prisão da morte e tinham sido outrora rebeldes, quando, nos dias de Noé…” (1 Pe 3 / 2ª L.). Onde se vê que a Redenção de Cristo (realizada no tempo: “morreu uma só vez pelos pecados”) tem também carácter retroativo (até os que “estavam na prisão… nos dias de Noé…”). A Salvação de Cristo Jesus é Universal, como não podia deixar de o ser!
E agora nós, quê!?… Pois que, ao iniciarmos esta “Quaresma” (40 dias, que reproduzem igualmente aquele significado bíblico), temos à nossa frente um novo período de prova, testagem, tentação… Trata-se, portanto, de um tempo ainda mais propício para – na nossa vida individual e coletiva – testarmos até que ponto somos capazes… E não teremos desculpas se não realizarmos essa autêntica conversão e purificação, uma vez que nós – isso sim! – somos privilegiados a respeito dos nossos irmãos antepassados “do tempo de Noé”, que, desde logo, não tiveram tantas oportunidades como nós, para a penitência… Não esqueçamos aquilo de: “A quem más se deu mais se pedirá”!
Antes de mais, temos bem presente, Senhor,
que as Tuas graças são eternas
e as Tuas misericórdias também;
porque Tu transcendes o tempo e o espaço,
embora, em Jesus e por Jesus,
quiseste entrar neste espaço e tempo,
que é o nosso tempo-espaço humano…
Assim, nós queremos entrar e caminhar
pelos Teus Caminhos, ó Pai nosso…
Por isso, ensina-nos as tuas veredas
e mostra-nos os Teus caminhos,
pois só Tu és o nosso Salvador transcendente…
E no caminho da nossa conversão e penitência,
ajuda-nos e guia-nos na Tua clemência,
por causa da tua bondade, Senhor…
E porque Tu és bom e reto,
e orientas os humildes na justiça,
dá-nos sempre a conhecer a Tua Aliança,
para aceitá-la e assumi-la na nossa vida…
[ do Salmo Responsorial / 24 (25) ]