8c- «Solidário» para «salvar»!

 (Ciclo C – Batismo do Senhor / domingo 1 … ) 

«SOLIDÁRIO» PARA «SALVAR»!

Imaginemos um país (de fantasia?) onde os lobos vulgares continuariam a ser “maus”, mas haveria “super-lobos” que seriam “bons”, muito bons! Suponhamos agora que um «super-lobo» se transformasse em «ovelha». Mas, atenção, não estamos a pensar no tal “lobo com pele de cordeiro” (que continua a ser lobo mau), pois este – como toda a gente sabe – disfarça-se desse jeito, apenas e só, para matar e devorar… No caso que agora idealizamos, o objetivo seria exatamente o oposto; porque, assim, este super-lobo bom poderia defender e salvar as ovelhas… Como? Bem. Pelo facto de “ser” ovelha, qualquer lobo poderia atacá-la sem suspeitar o menor perigo… Mas, ao conservar, ao mesmo tempo, a força e o poder do “super-lobo” daria cabo de todo e qualquer “lobo” desgraçado que se aproximasse… Acontece, ainda, que, na história que imaginamos, todas e cada uma das ovelhas do rebanho “são” super-lobos!

Na leitura atenta do Evangelho de hoje, aparece-nos, a este propósito, uma simples constatação que pode passar despercebida, mas que é fundamental e merece ser destacada. Na altura em que João Batista, no rio Jordão, andava “a batizar com água”… aconteceu um “pormenor”(!), em aparência normal mas que não podia menos que surpreender a quem sabia quem era Jesus de Nazaré. (É verdade que este evangelista não regista a surpresa e oposição inicial de João Batista, como o faz Mateus no texto paralelo / Mt 3, 13). Eis então como Lucas, o nosso evangelista de hoje, regista o episódio com esta frase, que não pode ser mais simples mas significativa: “Quando todo o povo recebia o batismo, Jesus também foi batizado” (Lc 3). Quererá isto dizer que Jesus recebe esse batismo como mais um pecador? Quem é que não se admira da atitude incompreensível de Jesus – homem-Deus, e portanto sem rasto de pecado – que recebe, como toda a gente, o mesmo «batismo de penitência e conversão para o perdão dos pecados»? – Bom, é que Deus, em Jesus, faz, do modo mais natural e singelo, as coisas mais maravilhosas! Até porque o mesmo João Batista acabava de proclamar acerca de Jesus: “…«Vai chegar quem é mais forte do que eu, do qual não sou digno de desatar as correias das sandálias. Ele batizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo»…”. (Lc 3 / 3ª L.).

Quer dizer, Aquele que pode “batizar com o Espírito Santo e com o fogo”, e que, portanto, não pode ser atingido pela marca do mal e do pecado, é capaz – desde a sua Incarnação – de carregar com as misérias da nossa carne humana! Assim, não admira que ocupe um lugar “humano”, na fila “humana” dos que estão a ser batizados por João “com a água” daquele rio…

Agora sim, já percebemos aquilo do “super-lobo” (não disfarçado!) mas transformado em “ovelha”. Diríamos melhor, incarnado! É só pensarmos, mais uma vez, na “altura e profundidade” desse inefável mistério que é a Encarnação. Claro que para Jesus, melhor do que “super-lobo”, seria o de “super-Homem” ou, então, de «Super-Star»!…

Porém, o fundo da questão, o núcleo do mistério, é exatamente essa Incarnação de Deus, ou seja, o vir a “ser” cada um de nós, e todos nós ao mesmo tempo! Porque, nos eternos desígnios do Pai-Deus, nada se pode “salvar” desde fora: Só é possível “divinizar o homem” desde a “humanização de Deus”! Quer isto dizer que o Filho de Deus tinha de se tornar mesmo “solidário”, ou seja, formar algo de “sólido” com o próprio homem – lembram-se? – para salvar a Humanidade. Isso mesmo: «Solidário» para «salvar»!  (Na verdade, só podia ser este o sentido daquela Palavra de Jesus, nas vésperas da “Sua Páscoa”: «Quando Eu for levantado em alto “arrastarei” tudo Comigo!» / Jo 12, 32). E «arrasta» porque Ele é «solidário»!

Tudo o mais, para Jesus e a sua Missão Salvadora, é consequência dessa realidade. Pelo facto de ser Filho de Deus, e Deus mesmo, “é chamado conforme a justiça” para ser “luz de todos os povos e nações”: “Fui Eu, o Senhor, que te chamei segundo a justiça; tomei-te pela mão, formei-te e fiz de ti a aliança do povo e a luz das nações…”. Ele terá uma paciência infinita e será sempre pacífico e pacificador: “…Não gritará, nem levantará a voz, nem se fará ouvir nas praças; não quebrará a cana fendida, nem apagará a torcida que ainda fumega: proclamará fielmente a justiça…”. (Is 42 /1ª L.). Pedro, no livro dos Atos dos Apóstolos, por seu lado, deixa bem patente qual foi a atitude e carisma deste Homem-Deus, Jesus, já desde o início mesmo da sua «vida pública»: “…Depois do batismo que João pregou: Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo Demónio, porque Deus estava com Ele»”. (At 10 / 2ª L.).

 

O Teu Pai e nosso Pai, Jesus,

abençoou desde há muito o nosso povo

com o melhor dom que nos podia dar:

fez de nós “seus filhos muito amados”

quando Tu, Seu Filho, ficaste “incarnado”

na nossa natureza humana total…

E em Ti, tributamos glória e poder ao Pai;

adoração e glória que é o nosso Amor;

força e poder divinos, sobrenaturais,

que sempre vencem todo o Mal…

Quando a voz do Deus omnipotente

ressoa sobre as nuvens para dizer

«Este é o meu Filho muito amado»,

está a proclamar sobre a vastidão das águas

– e em todo o universo para todos ouvirem –

que Tu, Jesus, és o nosso Irmão mais velho;

que, feito homem frágil como nós,

– solidário connosco nas fraquezas humanas –

consegues “elevar-nos” à Divindade…

Por isso – em Ti e por Ti, Jesus –

neste Templo Universal da Criação,

desde sempre e para sempre,

todos clamam: Glória!

 [ do Salmo Responsorial / 28 (29) ]