63b- Talis vita finis ita

 (Ciclo B – Assunção de Maria – 15 de agosto)  

«TALIS VITA FINIS ITA»

Outra vez “o latim”! E é uma sentença repetida pelos nossos “antigos latinos” para indicar a convicção geral da gente acerca da concordância entre «o teor da vida e o final dela» (“Tal a vida, assim o fim”). Quer dizer, o finaltranscendente – da vida não pode ir noutra direção que não seja aquela em que a própria vida foi processada, “vivida”, através desta existência terrena. Mas, atenção, é preciso evitarmos “equívocos”, para entendermos o sentido verdadeiro, que não é o que, numa apreciação aparente e superficial, poderia parecer. É que, se assim fosse, como seria o “final futuro” dos “desgraçados”, cuja vida nesta terra foi semeada de sofrimentos e dissabores? O seu futuro transcendente ia ser na mesma linha de amarguras e desgraças?… E, no extremo oposto, também não seria justo que, os que, neste mundo, viveram “na maior”, no meio de prazeres por vezes à custa dos outros, tiverem um fim futuro que prolongasse esse “prazer” indefinidamente! Uma e outra interpretação seriam contrárias à justiça mais elementar…

É evidente que o sentido da tal sentença “latina” refere-se ao campo da “justiça”, ou seja, tem um sentido ético, moral, espiritual… Toda a gente compreende que isto não poderia ser de outro modo, embora tantas vezes possa parecer-nos o contrário, na vida real (!?).

Mas todo este preâmbulo, porquê e para quê? Bem, pensamos nós que talvez venha a dar um novo sentido e dimensão a este mistério da Assunção de Nossa Senhora. Assim sendo, a Palavra desta Solenidade mariana fala-nos também de “lugares” e de “bens” ou “posses”. Enquanto vivemos nesta terra, é verdade que “ocupamos uns espaços” e “possuímos uns bens”. E podemos perguntar então: quais os “lugares” que frequentou (ocupou) Jesus de Nazaré e quais as “suas posses”?  E – por coerência e analogia – em que “ambientes” (espaços) viveu Maria, a Mãe, e quais foram os “seus bens e riquezas”?

Por enquanto, lemos no Evangelho de hoje, que Maria acudia e estava nos lugares onde havia que servir, para viver a sua atitude de serviço: “…Maria pôs-se a caminho e dirigiu-se apressadamente para a montanha, em direção a uma cidade de Judá… Maria ficou junto de Isabel cerca de três meses”…(Lc 1 / 3ª L.). Sabemos que foi para aquelas terras, diligentemente, para ajudar e assistir sua parente Isabel, que estava prestes a dar à luz. E o livro do Apocalipse, por seu lado, diz-nos, referindo-se, em sentido figurado, a Maria: “O templo de Deus abriu-se no Céu e a arca da aliança foi vista no seu templo… O filho foi levado para junto de Deus e do seu trono e a mulher fugiu para o deserto, onde Deus lhe tinha preparado um lugar”…(Ap 11-12 / 1ª L.). Lá está a Virgem e Mãe, Maria – a nova “Arca da Aliança” – no templo de Deus, “lugar” de oração e de intimidade com o Senhor… Esses são os “espaços” que Ela “ocupou” cá, na terra, no seu tempo de peregrinação. Lugares de serviço, espaços de oração.

Quanto aos “bens” mais prezados que Maria “possuiu”, aparecem igualmente nesses mesmos textos: “Estava para ser mãe e gritava com as dores e ânsias da maternidade… teve um filho varão… que foi levado para junto de Deus” (Ap 11-12 / 1ª L.). Ou então: “Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, o menino exultou-lhe no seio… Isabel ficou cheia do Espírito Santo”… E disse para Maria, “… bendito é o fruto do teu ventre…”. E Maria cantou: “… aos famintos encheu de bens”… (Lc 1 / 3ª L.). Sabemos que nada possuía aquela Virgem de Nazaré, a não ser os bens de que Deus enche aos famintos e pobres… Mas o único bem e riqueza que Maria possuía era, na realidade, como se está a ver, “o fruto bendito do seu ventre”, ou seja, Jesus-Deus. Todos os outros bens e riquezas…, tanto para Maria como para Jesus, estavam – como escreve Paulo – “aniquilados ou colocados debaixo dos seus pés” como todos os “inimigos” da salvação; “até o último inimigo a ser aniquilado que é a morte” (1 Cor 15 / 2ª L.).

Era lógico e coerente, na sequência de tudo isto, que também a morte fosse aniquilada, “ultrapassada”, pela Virgem Maria, e passasse por ela – como que “naturalmente” – da terra para o Céu, na sua «Gloriosa Assunção». Era evidente: «Talis vita finis ita»!

E está bem claro: Quem viveu onde se podia servir os outros… quem foi “templo divino” de oração e intimidade com Deus… e quem teve como único bem e riqueza Jesus – Deus incarnado, carne na sua carne – só podia ter como destino o “mesmo lugar” na Glória, e como “único bem e riqueza” na Eternidade, o próprio JESUS-Deus.

Cabe-nos, então, perguntar-nos: Qual será, lá, o nosso “destino” e “lugar”? Ou melhor: Na nossa vida, cá na terra, quais são “os nossos espaços”? E quais “as nossas riquezas”?… Pois uma coisa é certa, quer queiramos quer não, também para nós: «Talis vita finis ita»!

 

Também o nosso coração, Senhor,

como o de Maria – elevada ao Céu –

o nosso pequeno e humilde coração,

quer vibrar com belas palavras…

Porque, entre todas as “filhas de reis”,

está a Rainha, a Mãe, à Tua direita,

ornada com o fino “ouro de Ofir”…

Mas também queremos voltar-nos para ti,

Senhora da Assunção, e agora Rainha no Céu,

e dedicar-te o nosso “belo poema”:

«Honra e louvor a ti, Maria,

porque sempre viveste para servir

e agora todos te servem e glorificam.

Hossana e glória a ti, Virgem humilde,

porque, pobre, nada possuíste

– além do teu Filho e Deus humanado! –

mas agora Ele é a tua única riqueza,

desde aquele instante e por toda a eternidade…

E também nós queremos acompanhar

todas aquelas “filhas de reis”,

para entrarmos no Palácio do Rei,

cheios de entusiasmo e de alegria sem fim».

[ do Salmo Responsorial / 44 (45) ]