41a- Somos o que comemos...

 (Ciclo A – Domingo 18 -Tempo Com.) 

«SOMOS O QUE COMEMOS»… E VICE-VERSA!

Quando o profeta Isaías – em nome de Deus – fala de alimentos que se adquirem de um modo gratuito, é evidente que se está a referir a alimentos não materiais. E o que os profetas denunciam naquele povo de Deus é sempre o que tem a ver com o seu apego e afeição a tudo aquilo que é visível, palpável, material, consumível… “descartável”(?). Coisas que encham e satisfaçam o momento presente (o «carpe diem», de Horácio)… sem importar o que – depois e afinal – fique ou não fique, tenha sucesso ou nem tanto, exista ou não um horizonte de futuro, uma outra “vida” por trás e por dentro desta vida… Tal como é bem verdade que há um outro “alimento” por trás e para além deste que “vemos, tocamos e mastigamos”!

Eis o que diz a Palavra hoje: “Porque gastais o vosso dinheiro naquilo que não alimenta e o vosso trabalho naquilo que não sacia? Ouvi-Me com atenção e comereis o que é bom; saboreareis manjares suculentos. Prestai-Me ouvidos e vinde a Mim; escutai-Me e vivereis”… (Is 55 / 1ª L.). E, se “prestarmos ouvidos”, o que nos está dizer Deus (por Isaías) faz-nos pensar noutros textos bíblicos que o próprio Jesus nos recorda noutra altura, quando nos avisa: “… o homem vive de toda a palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4, 4). É verdade, para o bem e para o mal: «seremos o que comamos» e «comeremos o que sejamos» (!?).

Não quer dizer que o Senhor se desentenda do alimento corporal, necessário para a vida e saúde humanas. Bem sabe o nosso Pai Deus que precisamos de pão para viver… e assim, Ele cuida do nosso alimento muito melhor do que o faz com as aves do céu (cf. Mt 6, 26). Mas isto é ainda mais claro e patente no Evangelho de hoje. E observamos como Jesus, porque está atento às necessidades da gente, fica “cheio de compaixão” e trata de resolver imediatamente os seus problemas. Porém, às vezes, permite ou deixa que os seus discípulos se adiantem para que eles descubram e tentem resolver essas carências. É o que sucede no episódio de hoje: “Ao cair da tarde, os discípulos aproximaram-se de Jesus e disseram-Lhe: «Este local é deserto e a hora avançada. Manda embora toda esta gente, para que vá às aldeias comprar alimento». Jesus disse-lhes: «Não precisam de se ir embora; dai-lhes vós de comer»”… Contudo, e perante a manifesta impotência dos discípulos, Ele toma a iniciativa e resolve imediatamente, até porque, quem tem o corpo faminto ou falto do alimento necessário, não está em condições de alimentar a alma com a Palavra de Deus. “Tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao Céu e recitou a bênção. Depois partiu os pães e deu-os aos discípulos, e os discípulos deram-nos à multidão. Todos comeram e ficaram saciados”… (Mt 14 / 3ª L.).

Então, sim. Nestes corpos saciados, os espíritos estão prontos para receberem o alimento da Palavra, como, aliás, dizia a 1ª leitura, referindo-se já a “o outro alimento”: “Prestai-Me ouvidos e vinde a Mim; escutai-Me e vivereis… E firmarei convosco uma aliança eterna” (Is 55).

E nós agora? Como é que estão os nossos corpos… e os nossos espíritos? Se for verdade que, graças a Deus, os corpos estão mais ou menos “bem tratados”… como é que estão os nossos espíritos face à Palavra de Deus? Será que estamos dispostos e preparados para “prestar atenção” e escutar a Palavra, para recebê-la e aceitá-la, e sobretudo, para assimilá-la, como se assimila o alimento, e fazê-la vida da nossa vida?

Experimentemos agora se, na vida de cada um de nós, a resposta a esta questão é afirmativa ou não. Vejamos – por exemplo! – se somos capazes de entender e assumir, ou “assimilar”, esta Palavra de hoje (em S. Paulo): “Quem poderá separar-nos do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, o perigo ou a espada? Mas em tudo isto somos vencedores, graças Àquele que nos amou. Na verdade, eu estou certo de que… nada nem ninguém… poderá separar-nos do amor de Deus, que se manifestou em Cristo Jesus, Nosso Senhor”. (Rm 8). E, aliás, como se está a ver, a outra “fome”, a material, também não será capaz de nos separar do Amor!

Porque estamos certos e confiados

nas Tuas mãos, Senhor,

que estão sempre abertas e prontas

para saciar a nossa fome de pão…

e porque todos temos os olhos em Ti,

que a seu tempo nos dás o alimento…

podemos e queremos dedicar-nos,

com todas as forças do corpo e da alma,

a procurar o alimento espiritual,

pois somos sobretudo espírito

e «devemos comer o que somos»…

Continua então, Senhor, a abrir as Tuas mãos

para a todos saciardes generosamente,

com essa Tua imensa misericórdia

que se estende a todas as criaturas…

E seja sobretudo a Tua Palavra e a tua Vida

– no “Corpo” Eucarístico do Teu Filho –

que alimente o nosso espírito, porque também

«queremos ser O que comemos»…

Tu serás sempre, Senhor, clemente e compassivo!

              [ do Salmo Responsorial / 144 (145) ]