48a- misericórdia, além da justiça

(Ciclo A – Domingo 25 -Tempo Com.)  

MISERICÓRDIA, ALÉM DA JUSTIÇA!

Uma vez que a nossa tendência… vai para o egoísmo, é natural que confundamos os “termos”. Não em vão nos acautela a filosofia popular daquele ditado: «Pensa o ladrão que todos são da sua condição».

Além disso, ao longo das três Leituras da Palavra de hoje, aparecem-nos diversos dilemas, contrapostos, que estão querer dizer-nos alguma coisa. No profeta Isaías: “O céu (acima)… a terra (em baixo)”; em S. Paulo aos Filipenses: “Partir já para estar com Cristo… ou ficar ainda no corpo mortal”. E, sobretudo, na parábola do Evangelho de Jesus: “Trabalhar ou estar sem fazer nada”; “Estes trabalharam menos… do que nós”; “Paga-lhes o salário a começar pelos últimos… e a acabar nos primeiros”; “Será que os teus olhos são maus… porque eu sou bom?”. Tudo isto alerta-nos neste sentido: Tudo aquilo que, na vida, nos parece “normal” pode ser o oposto e contrário do que é “bom e melhor”. Quantas vezes nos aconteceu isto no percurso da nossa caminhada vital! Não é verdade?

Vamos tentar, então, descobrirmos qual deve ser o nosso proceder e atuação, para não nos deixarmos levar pelo que “parece normal”, pelo que “toda a gente faz”, por aquilo que parece “justo e razoável”, ou porque achamos que estamos “no nosso direito”…

Até certo ponto, estas coisas todas podem ter uma parte de “justiça”… mas não chega se olharmos com a perspetiva do «Deus de Jesus». Para já, Ele próprio nos avisa – desde “o Seu oráculo” – em Isaías: “Os meus pensamentos não são os vossos, nem os vossos caminhos são os meus. Tanto quanto o céu está acima da terra, assim os meus caminhos estão acima dos vossos, e acima dos vossos estão os meus pensamentos”. Está bem claro, para já, que deveremos “mudar” a nossa perspetiva (“pensamentos”) ao mesmo tempo que “convertamos” (= virar a direção) os nossos “caminhos”, para os adaptar e conformar com os de Deus. Isto pode parecer quase impossível, dada a grande “distância” que os separa (“tanto quanto o céu está acima da terra”). Mas as palavras do profeta – “oráculo do Senhor” – não são para nos desanimar; antes ao contrário, se tivermos em conta que essas palavras, que acabamos de transcrever, vêm a confirmar o texto imediatamente anterior, que diz: “Deixe o ímpio o seu caminho, e o homem perverso os seus pensamentos. Converta-se ao Senhor, que terá compaixão dele, volte para o nosso Deus, que é generoso em perdoar” (Is 55 / 1ª L.).

Por isso, precisamente, desenvolve Jesus a sua parábola magistral, no seu Evangelho de hoje, de maneira que apareçam “as chaves” fundamentais para essa “radical conversão”. Desde logo e antes de mais, todos e cada um de nós, devemos trabalhar e pôr a render os talentos que nos foram confiados (os “da primeira hora”… os “da meia-manhã”… os “do cair da tarde”… os “do anoitecer”). Porque o prémio (“salário”) vai ser sempre “muito mais do que justo”. E como o Deus de Jesus é muito melhor e imensamente mais generoso do que nós poderíamos imaginar, ainda que “comece pelos últimos e acabe pelos primeiros”, todos serão contemplados pela Sua bondade (Ele sempre será “bom” apesar de que alguns tenham “olhos maus”); e serão envolvidos pela Sua generosidade e pela Sua misericórdia. E não é outro o sentido da síntese conclusiva desta parábola (a tal reviravolta que Jesus utilizou em várias ocasiões): “Os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos”. (Mt 20 / 3ª L.).

Era bom para nós que, se nos considerarmos alguma vez “dos primeiros”, agíssemos – como também gostava Jesus de dizer – “colocando-nos no lugar mais humilde”, desde onde se pode contemplar melhor qualquer irmão, para o compreender, ajudar e amar sempre. Quanto mais não seja, porque «quem não está em baixo não pode ser exaltado»! E já agora, esse lugar humilde – lembram-se? – era o sítio que gostava de ocupar Maria, a Mãe de Jesus e nossa Mãe. Desde esse “sítio” via melhor as necessidades de todos os seus filhos… (como nas «bodas de Caná», por exemplo). E, devido a este “lugar” que ocupou… era lógico que fosse exaltada, como ninguém! É, aliás, um modelo fácil de imitar por nós, os seus filhos! Não é?

E temos também o exemplo de Paulo, que bem podia escrever aos cristãos (de Filipos): “Procurai somente viver de maneira digna do Evangelho de Cristo”; porque era assim que ele vivia. Será que um dia poderemos nós chegar a afirmar, como ele: “Para mim, viver é Cristo e morrer é lucro”? (Fl 1 / 2ª L.).

Enfim, hoje ficamos com este corolário: O Senhor, o Deus de Jesus, aposta sempre no melhor, que é a bondade e a MISERICÓRDIA para com todos, indo sempre para além da JUSTIÇA, porque esta, embora deva amparar a todos, só ela, não chega para salvar qualquer um dos humanos (!).

Também nós, ó Pai nosso, queremos

louvar o Teu nome para sempre

e bendizer-Te, dia após dia…

Porque Tu vais mais além da justiça:

és paciente e cheio de bondade,

clemente, compassivo e misericordioso…

Tu sempre estás mais perto dos humildes,

dos que se acham nos últimos lugares…

Mas és bom para com todos, Senhor,

e a Tua misericórdia se estende

a todos os seres, criados por Ti… Por isso,

com a Mãe – Tua e nossa – nós louvamos:

«Magnificat anima mea Dominum… porque

abaixas os poderosos e exaltas os humildes!»…

                             [ do Salmo Responsorial / 144 (145) ]